quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Esquizofrenias da sociedade


Renato era um psiquiatria muito experiente e recordava o trecho de um artigo nos seus anos iniciais de quando ainda era estudante:
A esquizofrenia, talvez o transtorno mental de maior comprometimento ao longo da vida, caracteriza-se essencialmente por uma fragmentação da estrutura básica dos processos de pensamento, acompanhada pela dificuldade em estabelecer a distinção entre experiências internas e externas. Embora primariamente uma doença orgânica neuropsiquiátrica que afeta os processos cognitivos[de conhecimento], seus efeitos repercutem-se também no comportamento e nas emoções.

Hoje era o primeiro dia de sua aposentadoria e conversava com sua jovem atendente Maria, de apenas 20 anos, que o acompanhara por toda sua vida juntamente com sua pequena filha Clara de apenas 2 anos. Ele sabia que tinha esquizofrenia, pois conseguira dominar os labirintos da razão por perceber que sua atendente com sua filha jamais envelhecera ao longo destes 30 anos. Mantinha a mesma formosura jovial e sua filha clara continuava sendo aquela menina dócil e meiga. Uma característica interessante é que o balcão de atendimento sempre estava arrumado para Maria embora , na realidade, ela nunca existira para nenhum de seus pacientes. Talvez, por isso, Renato conseguira um ótimo resultado junto a seus pacientes que, inclusive, acabaram “adotando” personagens marcantes em suas vidas, por entenderem que era possível ser feliz, mesmo na aparente ilusão que permeava o seu mundo incompreensível muitas vezes para a sociedade.
Em uma entrevista a uma grande rede nacional em decorrência do prêmio nobel que recebera por serviços prestados a sociedade o entrevistador com uma dose de ironia perguntou-lhe:
– Renato, você não quer que ofereçamos uma água para Maria e um brinqiedo para sua filha Clara?
Neste momento, uma mistura entre risos e tensão dominavam o auditório. Renato, com sua autencidade respondera.

– Muito obrigado por sua preocupação mas receio que Maria não toma água há mais de 30 anos e Clarinha sempre a vejo correndo para lá e para cá sem nenhum brinquedo. Inicialmente não conseguia entender isso, mas percebi que elas sempre estavam felizes deste jeito e, sinceramente, mudaram minha vida. Inclusive, isto serviu de tema para o meu livro atual “ Esquizofrenia social” onde destaco o fato de que todos somos esquizofrênico em maior ou menor grau.
– Como assim Renato? Esta sua teoria não contraria a noção da mente saudável, tão difundida pela neurociência ?
– Isto depende de paradigmas que a sociedade criou. Por exemplo, sabemos nas mais variadas religiões que as nossas atitudes devem ser sempre positivas acompanhadas de otimismo e felicidade com o único intuito de servir ao próximo pois, quando chegar a nossa hora, teremos que prestar conta da nossa vida através dos que muito chamam de lei de   retorno. Se acreditamos nisso e fazemos o contrário, isto acaba sendo o desvio da razão que constitui um tipo de esquizofrenia. Ou seja, de um modo ou de outro, grande parte da sociedade é esquizofrênica, não é Maria ?
Risos ecoavam pelo auditório acompanhada de palmas eufóricas.Renato continuou.
- De um tempo para cá, venho escutando constantemente a voz de Deus em vários momentos do meu dia. É uma certeza absoluta de que estou definitivamente me curando da esquizofrenia.
O entrevistador retruca:
– Como assim, Maria e Clara vão desaparecer ?
– Deixe explicar -me melhor. Maria e Clara são anjos enviados por Deus para me fazer lembrar que sou privilegiado por servir a humanidade. Elas sempre me acompanharão independente do que possa pensar. Elas fazem parte da minha felicidade de ser um servo de Deus e apenas estou sendo usado para mostrar isso aos meus pacientes. Se me permite quero te fazer uma pergunta .
– Claro , Doutor Renato. Estou a disposição.
– Quem é sua Maria e sua Clara ? Ou seja. Quais os motivos para você ser feliz ?
– Desculpe doutor. Não ando vendo coisas.
– Entendo.

As pessoas necessitam entender que os personagens de sua verdadeira felicidade estão no seu interior e não necessariamente, como no meu caso, precisariam ser procuradas externamente. Quando compreendi isso, consegui conviver perfeitamente com a sinergia ente o meu mundo interior e exterior.Maria e Clara são apenas reflexos dos meus traumas e bloqueios infantis que agora são apenas imagens virtuais do meu passado. É necessário despertar a felicidade dentro de cada um de nós,independente de existitirem Marias e Claras. Ela está na alma e não nos preconceitos e normas da sociedade.
Do site de Karlão Palestras

Um comentário:

Elisangela Silva disse...

Matéria fascinante. Parabéns Pedro.
Elisângela Silva